sexta-feira, 28 de maio de 2010

Ser tecto, parede, chão

Nunca tinha reparado, julgava, na união entre a parede o tecto. A partir de que ponto exacto passava a parede a ser tecto. Devia ser uma guerra disputada ao milímetro, entre cada partícula de cimento e tijolo, ambas querendo estar no cimo de uma divisão. Ser tecto é estar no topo. Ser parede é ter uma existência confinada à eternidade da constante ascensão. Ascender ser numa atingir. Ser tecto é ser observador, porque vê tudo de cima. Ser tecto é ser detective – vê as pessoas mas as pessoas não o vêem. As pessoas não o vêem porque dá muito trabalho olhar para cima, e fazer um ângulo recto com o pescoço. E porque, em geral, os tectos são todos iguais uns aos outros. Não têm decoração, ao contrário das paredes, o que os torna desinteressantes. Exceptuando os das igrejas, catedrais, museus, edifícios especiais, que fogem à regra, e para onde todos olham. Nesses locais, aponta-se para cima, e diz-se “Olha o tecto!”, e por um momento as pessoas olham, e o tecto é olhado. Não acham estranho olhar, mas se estivessem numa casa normal achariam. E… até que ponto um tecto branco não é mais bonito que um pintado? Nas artes modernas que começam a entrar em força nos museus existem quadros só brancos. Pendurados em paredes. Se calhar coisas em paredes são mais admiradas que coisas em tectos. É preciso pensar seriamente nesta diferença entre ser tecto e ser parede. E ser chão. Os tês estados da existência são ser tecto, parede, ou chão. É preciso saber-se ser tecto, parede, e chão.

excerto meu do capítulo XVIII da «Paris»

terça-feira, 4 de maio de 2010

Dezassete anos. Reflexão. Longe de Lugares-Comuns.

Mis amigos... desta vez não vim com as tretas de «o último dia com 16 anos», «aproveitar» e «saudades desta idade». Não. Passou mais um dia, não mais um ano. Acontece que o dígito na idade avançou um número. 17. Dezassete. Muitos falam desta idade como bons tempos, já vários hoje me disseram para a aproveitar. Fá-lo-ei, como sempre fiz na vida... jamais o meu objectivo foi estar-me a lixar e querer passar à frente. Não. Mesmo que inconscientemente estamos sempre a aproveitar, nas escolhas que fazemos.

Não queria entrar em discursos WHOOHOOO, que são bastante filosóficos, mas não levam a mais lado nenhum. Não. Estou contente por ter esta idade, estou contente com a minha vida, com as pessoas que chegam cá a casa. Fica sempre um vazio quando se vão embora, quando chega a hora de ir dormir. Oiço «gostámos muito deste bocadinho», vão embora, fico eu, fechadinho numa concha com o rótulo «17» e acordo com um mundo colorido à minha frente. Confirmo que nada mudou. Continua tudo bem.

Enquanto as manhãs forem assim, o meu mundo é feliz. Enquanto existirem manhãs, nasceres do sol, enquanto existirem sorrisos e aragens frescas num céu azul claro de Verão ou Inverno (mas sempre, sempre, com o sol à vista), há vontade de viver.

Viver. Dezassete anos. Não me venham com coisas de aproveitar. Todos o fizémos, de uma maneira ou de outra. Os meus dezassete são o meu presente, não o passado dos outros.

Até já. Tenho uma manhã sorridente à minha espera, quando sair da concha ao nascer do sol.

Obrigado meu Deus.
 

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