domingo, 18 de outubro de 2009

Pseudo-Auto-Entrevista

Está-me a apetecer fazer uma entrevista a mim próprio, como um apresentador de televisão interroga um autor apaixonado pela literatura que lê e que produz.

Com que idade começou a escrever?
Olha, comecei a escrever com cinco anos (risos). Ou pelo menos as primas letras, e assim. Creio que para se inventar histórias e as escrever é necessário dominarmos minimamente a língua, daí que, como observo pelos meus cadernos da primária, o meu processo criativo no papel começou mais ou menos com os meus 7 ou 8 anos.

De que género de histórias estamos a falar?
Essencialmente ligadas a mistérios, investigações... digamos, policiais (risos)! Na verdade, autênticos policiais. Eu e um grupo de amigos éramos os personagens; formávamos um clube detective e investigávamos os casos com que nos íamos confrontando. Desde um misterioso papel, ao desaparecimento de pessoas... o problema é que as histórias nunca acabavam!

Porquê?
Como muita gente, escrevi dezenas de começos de histórias até finalmente ter conseguido acabar uma... neste caso, sete anos mais tarde! Sim, parece assustador, e à primeira vista faz pensar que é necessária uma grande persistência. Na verdade, não é. Sim, de vez em quando ficava frustrado por não conseguir acabar esta ou aquela história, ou por pensar que tinha tido uma grande ideia e não a conseguia desenvolver... essa falta de ânimo incomoda, sim... mas o prazer encontrava-se essencialmente no acto de começar uma nova história. Foi nisso que acreditei durante muitos anos.

"Durante muitos anos"... quer então dizer que já não é assim?
Não necessariamente. Ou talvez sim. Agora não sei bem o que responder, estou confuso (risos). Mas sim, posso dizer que antes começar uma história era algo memorável, em que escrever "Capítulo 1" me punha fora de mim, com tanta vontade de a escrever. Era uma sensação épica,d e que estava perante o projecto da minha vida - embora soubesse perfeitamente, no fundo do meu ser, que nunca a iria terminar. De facto, tenho quase trinta histórias. Ou trinta começos, como preferires.

Podes desenolver um pouco mais a ideia? Ou seja, disseste que antes sentias que o começo era algo épico... agora já não é?
Não sei. Estou numa fase de transição, digamos assim. Certos factores estão a levar-me nesse sentido. Por exemplo, o facto de ler muito mais do que lia. Isso é uma grande ajuda. E, falando especificamente da história que estou a escrever, a Paris, não senti nada quando a comecei escrever. As primeiras páginas foram escritas por ser escritas; aliás, só coloquei o "I" de primeiro capítulo quando o terminei de escrever (risos)! Ou seja, nota-se aqui uma grande diferença.

Não tem saudades dos tempos em que o acto de começar a história é que era a melhor fase do projecto?
Era a melhor fase do projecto porque era uma das poucas! E não, não tenho saudades. Acho que descobri que tenho de manter a calma, manter o nível de entusiasmo constantemente num nível médio, para não criar expectativas elevadas.

Obrigado, Tiago. Pode ser que continuemos esta entrevista em breve. Ou se calhar só daqui a uns anos.
Obrigado eu. E sim, eu sei como é complicado conciliarmos as nossas vidas para arranjarmos um tempo livre comum aos dois para fazermos estas coisas (risos).

*

sexta-feira, 16 de outubro de 2009

Como um peixe na água

[Foto minha, espaço Animateatro, Maio de 2009]

Hoje, há menos de meia hora, disseram-me uma coisa muito verdadeira. Senti que, naquele momento, alguém me retratara exactamente como eu até então tinha a noção de ser. Mas vamos por partes. Para quem não sabe, eu amo teatro. Não consigo imaginar o meu dia-a-dia sem a expectativa de uma vez por semana, agora duas, não me juntar com um grupo para fazer teatro, ou exercícios relaccionados com teatro, ou qualquer coisa que se assemelhasse a teatro. Eu sei que disse demasiadas vezes teatro, mas não me importa, digo mais: teatro teatro teatro teatro. Se não chegar, tomem mais uma: teatro.

Teatro.

Já perceberam que é um gosto muito grande que tenho. Muito provavelmente o maior. Ora estava eu hoje no Núcleo de Teatro da Escola quando, depois de termos decorado durante duas semanas um soneto, chegou o momento de o declamarmos. Fui ao palco, e disse-o.

Com mãos se faz a paz se faz a guerra,
com mãos tudo se faz e se desfaz,
com mãos se faz o poema e são de terra
com mãos se faz a guerra e são a paz.

Com mãos se rasga o mar; com mãos se lavra
Não são de pedras estas casas mas
de mãos. E estão no fruto e na palavra
As mãos que são o canto e são as armas.

Cravam-se no tempo como farpas
As mãos que vês nas coisas transformadas.
Folhas que vão no vento: verdes harpas.

De mãos é cada flor cada cidade
ninguém pode vencer estas espadas!
Nas tuas mãos começa a liberdade.

Depois sentei-me, e vi os os outros declamarem o mesmo poema. De Manuel Alegre, a propósito. No fim, o encenador disse-nos para, a seguir, voltarmos a ir dizer o poema, só que encarnando um sentimento/personagem levada ao extremo. Podíamos exagerar. Exagerei. Pus-me a gritar, o meu corpo a tremer todo involuntariamente, sentindo a tristeza, à medida que dizia as palavras sem pensar nelas. A minha respiração era entre cortada, e estava desesperado. No fim não consegui deixar de tremer. Não consegui dizer uma palavra, a não ser obrigado quando o encenador me disse como tinha corrido.

E foi então que alguém na plateia, um dos outros alunos, disse algo. E é esta a parte mais importante:

«O Tiago parece que muito estranho, quase maluco, quando nos vemos lá fora, sempre a contar piadas, e assim! Mas aqui dentro, no teatro, ele parece que está super à vontade: como um peixe na água.»

Foi uma das coisas mais verdadeiras que alguma vez me disseram. E eu senti-me completo naquele momento. É verdade. No palco... sou um peixe na água.

sábado, 10 de outubro de 2009

A Esperança Está Onde Menos se Espera

[Poster oficial do filme de Joaquim Leitão]

Nos últimos anos, têm vindo a ser feitos alguns filmes portugueses, mais ou menos todos à volta da mesma temática. Do agrado de alguns, e desagrado de outros (nomeadamente meu), a minha opinião acerca do cinema «made in Portugal» caía a pique. Com este filme, a tendência não só se inverteu, como fiquei à espera do próximo filme de Joaquim Leitão - de preferência, que jogue outra vez pela originalidade, como fez com este A Esperança Está Onde Menos Se Espera.

Entrei na sala com a expectativa muito elevada. Vira o trailer umas cinco vezes, lera críticas pelos blogs e sites especializados, e as opiniões divergiam. Curiosamente, nem as negativas me baixaram o ânimo para ver o filme. Sentei-me, esperei que o filme começasse. O filme estava já na sua terceira semana de exibição, e mesmo assim deviam estar umas 50 pessoas na sala.

Assim que começou, tive logo a sensação de que o que aí vinha era algo poderoso. Um filme que não só ia de encontro com aquilo que eu estava à espera, como ia exceder tudo o que podia ter imaginado. Ao longo das cenas, a emoções foram mudando. Divertimento, pena, tristeza, saudade, esperança, desespero...

E fui o último a sair da sala, porque tive de esperar que os créditos chegassem ao fim para me conseguir levantar da cadeira, de tal forma o filme me tocou. Embora a interpretação de uma ou outra personagem tivessem deixado um pouco a desejar, A Esperança Está Onde Menos se Espera entrou para a elite dos melhores filmes que já vi de sempre.

Ainda vai estar em alguns cinemas até à próxima quinta-feira. Não podem perder este.
 

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