sexta-feira, 16 de outubro de 2009

Como um peixe na água

[Foto minha, espaço Animateatro, Maio de 2009]

Hoje, há menos de meia hora, disseram-me uma coisa muito verdadeira. Senti que, naquele momento, alguém me retratara exactamente como eu até então tinha a noção de ser. Mas vamos por partes. Para quem não sabe, eu amo teatro. Não consigo imaginar o meu dia-a-dia sem a expectativa de uma vez por semana, agora duas, não me juntar com um grupo para fazer teatro, ou exercícios relaccionados com teatro, ou qualquer coisa que se assemelhasse a teatro. Eu sei que disse demasiadas vezes teatro, mas não me importa, digo mais: teatro teatro teatro teatro. Se não chegar, tomem mais uma: teatro.

Teatro.

Já perceberam que é um gosto muito grande que tenho. Muito provavelmente o maior. Ora estava eu hoje no Núcleo de Teatro da Escola quando, depois de termos decorado durante duas semanas um soneto, chegou o momento de o declamarmos. Fui ao palco, e disse-o.

Com mãos se faz a paz se faz a guerra,
com mãos tudo se faz e se desfaz,
com mãos se faz o poema e são de terra
com mãos se faz a guerra e são a paz.

Com mãos se rasga o mar; com mãos se lavra
Não são de pedras estas casas mas
de mãos. E estão no fruto e na palavra
As mãos que são o canto e são as armas.

Cravam-se no tempo como farpas
As mãos que vês nas coisas transformadas.
Folhas que vão no vento: verdes harpas.

De mãos é cada flor cada cidade
ninguém pode vencer estas espadas!
Nas tuas mãos começa a liberdade.

Depois sentei-me, e vi os os outros declamarem o mesmo poema. De Manuel Alegre, a propósito. No fim, o encenador disse-nos para, a seguir, voltarmos a ir dizer o poema, só que encarnando um sentimento/personagem levada ao extremo. Podíamos exagerar. Exagerei. Pus-me a gritar, o meu corpo a tremer todo involuntariamente, sentindo a tristeza, à medida que dizia as palavras sem pensar nelas. A minha respiração era entre cortada, e estava desesperado. No fim não consegui deixar de tremer. Não consegui dizer uma palavra, a não ser obrigado quando o encenador me disse como tinha corrido.

E foi então que alguém na plateia, um dos outros alunos, disse algo. E é esta a parte mais importante:

«O Tiago parece que muito estranho, quase maluco, quando nos vemos lá fora, sempre a contar piadas, e assim! Mas aqui dentro, no teatro, ele parece que está super à vontade: como um peixe na água.»

Foi uma das coisas mais verdadeiras que alguma vez me disseram. E eu senti-me completo naquele momento. É verdade. No palco... sou um peixe na água.

1 comentários:

Andreia Veríssimo disse...

É verdade sim senhora!! Podes ser o maior maluco que conheço mas és das pessoas com mais talento que eu vejo no teatro :)

 

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